Don L, muito mais guerrilheiro que MC
Lançado em 2021, álbum “Roteiro para Äinouz (Vol. 2)” é destemidamente revolucionário e recheado de referências.
Em “a todo vapor”, terceira faixa de seu disco, o rapper e compositor cearense se autodeclara mais guerrilheiro que MC, e em entrevista ao Brasil de Fato, revelou: “Ser comunista me tirou das capas dos jornais”.
A trilogia autobiográfica narrada regressivamente, homenageia o diretor e roteirista Karim Äinouz e tem início em 2017, com “Roteiro para Äinouz (Vol. 3)” que analisa e critica o cenário musical do país. Neste segundo volume, Don L explora o passado colonial e o momento da revolução.
Entre as 17 faixas do disco, “vila rica”, “volta da vitória” e “pânico de nada” se destacam. São músicas que, além de bem produzidas e com uma sonoridade envolvente, escancaram por meio das letras o viés comunista e revolucionário do rapper.
Em “vila rica”, a segunda música do álbum, antecedida somente por um interlúdio e que leva o nome original da cidade de Ouro Preto, Don L nos introduz ao colonialismo e ao saqueamento de toda riqueza e a dizimação da população local. “Nós tivemos baixas incontáveis; na real já foi uma revolução, já foi uma comunidade; por cima de sangue derramado; já fomos quilombos e cidades, Canudos e Palmares; originais e originários, depois do massacre, ergueram catedrais; uma capela em cada povoado, como se a questão fosse guerra ou paz; mas sempre foi guerra ou ser devorado”, canta.
“Pânico de nada” vem logo após, e agora retrata uma revolução em andamento na forma de guerrilha urbana, que denomina de guerra santa. Nessa faixa, o compositor constroi um cenário caótico de dominação da cidade pelo povo como sempre sonhou. Reforça ainda que não sente pânico, pois “eles sangram como eu sangro”.
Utilizando trechos da música “Us mano e as mina” do rapper Xis, Don L introduz sua oitava faixa, “a volta da vitória”, que resgata a memória de Amaro e Aleixo, militantes do PCR (Partido Comunista Revolucionário), Ajuricaba, líder indígena na luta contra a colonização portuguesa, Dandara, Leila Khaled e Cacique Piquerobi.
Na mesma faixa, o compositor ainda sonha com a concretização da revolução, como no trecho: “desfilando em conversíveis na Paulista; com as armas para o ar; eu sabia que viria o dia”. E reafirma que apesar das inúmeras tentativas de minar a força do coletivo revolucionário, a luta continua. “Descendemos desses sonhos; e nunca morremos; nos mantivemos em cada assembleia, cada célula; cada rincão, viela; em cada pregação, cada cеla; cada missão contando cédulas; comprando as bélicas; voltamos pra ficar e bó nessa”, compôs o artista.
(Matéria não publicada, escrita em 10/05/2024)
Viva Don L!